27.7.09

a grande vingança.

Cinco da tarde. Escritório central do FBI.

"Interceptamos uma ligação entre nosso suspeito e os possíveis compradores da arma" disse Smith. "Temos duas horas. Sanderson e Mcmillan. Quero que cerquem a ala leste do edifício. O'Brian e Chapman. Vocês dois aguardarão no acesso norte. Christopher, você dá cobertura para O'Brian e Chapman. Ao meu sinal, quero que avancem."

O olhar de Smith parecia concentrado em um ponto da parede no final da sala.

"Vocês precisam ter o máximo de cuidado" continuou Smith. "Um grama desta arma é capaz de transformar a Times Square em poeira. Não sabemos ao certo qual o grau de loucura do Dr. Heinz, portanto não sabemos do que ele será capaz de fazer quando nos vir. Precisamos ser rápidos e cirúrgicos. Entendido?"

"Capitão?" Renzi levantou a mão.

"Sim, agente Renzi?"

"Com todo respeito, mas o mundo estará a um fio de ser destruído naquele edifício e eu ficarei aqui, sentada, esperando tudo acabar?"

"Agente Renzi, nós sabemos muito bem que você não é apta para o serviço. Fique aqui e analise essa pilha de documentos do imposto de renda."

"Mas capitão Smith, eu sou tão competente quanto qualquer um dos outros agentes desta companhia. Eu descobri a fórmula X e acredito que sou tão ou mais apta que meus colegas para lidar com esta arma."

"Descobrir a fórmula X foi mero acaso. Agora volte para a sua sala e prepare uns muffins para nossos companheiros. O meu de blueberry, por favor."

"Senhor! Eu não aceitarei tal tratamento! Eu estou nesta companhia há 23 anos, dedico minha vida ao FBI e até hoje ninguém me deu a chance de sair a campo e enfrentar um inimigo de verdade! Estou farta de ser esquecida, subjulgada e desprezada!"

Neste momento, Renzi começou a se curvar furiosamente e todos seus companheiros se assustaram com o que veio depois. A agente havia se transformado em um grande monstro de muffin de blueberry e começou a urrar palavras de ódio.

"VENHA CAPITÃO, AQUI ESTÁ SEU MUFFIN! GRRRRRAAAAAAAUUUU".

E assim a agente Renzi exterminou seus companheiros de trabalho e foi contratada pela produtora japonesa YHDG, onde hoje faz sucesso com a criançada em um canal da televisão local.

25.7.09

irmãs.

A vida é um fio.
Já diziam as Moiras.
Um fio tão frágil quanto a própria vida.
Para onde vamos quando é rompido?
Para onde corremos?
.
.
.

22.7.09

parece que fala de mim.

"Você via logo que Alex era inteligente", reflete Westerberg, acabando seu terceiro drinque. "Lia muito. Usava um monte de palavras pomposas. Acho que parte do que complicou sua vida talvez tenha sido que ele pensava muito. Às vezes fazia força demais para entender o mundo, saber por que certas pessoas eram más com as outras. Um par de vezes tentei lhe dizer que era um erro se aprofundar tanto naquele tipo de coisa, mas Alex empacava. Tinha sempre que saber a resposta certa e absoluta antes de passar para a próxima coisa."

Trecho de Na Natureza Selvagem, de Jon Krakauer.

21.7.09

dilema.

"é fácil. pule, eu te seguro."
"não, não."
"eu te seguro, confie em mim."
"eu tenho medo de cair. tenho medo que seus braços não aguentem o peso do meu corpo, ou que você se esquive no momento da queda."
"eu já disse que nada disso vai acontecer. eu nunca te deixaria cair."
"mas..."
"o quê?"
"por que descer? eu gosto daqui. a vista é muito bonita."
"porque você mesmo disse que não gosta daí de cima. venha, eu te seguro."
"mas se eu descer, nunca mais poderei ver este lado da vila."
"você não pode ter os dois. mas se você acha que observar daí de cima o lado em que estou é o mesmo que viver aqui, eu digo que está enganado."
"e se eu quiser voltar?"
"você volta. não é uma viagem apenas de ida. você volta se quiser."
"você ficaria triste?"
"sim, mas eu ficaria mais triste se você nunca descer, porque daí eu nunca terei a chance de te fazer feliz aqui embaixo. e você nunca saberá se teria sido mais feliz aqui."

19.7.09

está escrito.

Pedaços de papel. Pedacinhos de papel flutuando numa bacia cheia de água.
Em cada um deles, uma única letra.
Todos bem fechadinhos, com cuidado, dobrados em três.
Durante toda a noite ficarão onde estão a menos que uma gota de chuva, um passarinho ou uma folha os faça dançar, para depois voltarem à inércia de antes.
E, por algum motivo, um destes pedacinhos de papel será mais esperto que os outros e revelará a letra nele contida. Ele se abrirá lentamente no decorrer da madrugada e, pela manhã, estará todo sorriso, triunfante.
A menina nova ao acordar corre para a bacia. E surpresa vê a escolhida pelo orvalho.
Esta será a inicial de seu marido e ela nunca mais esquecerá da letra que contém seu destino.

17.7.09

reflexão sobre a modernidade.

Eu tenho um diário. Sim, de papel e tudo. Mas não é aquele de adolescência, com "querido diário". É apenas uma outra válvula de escape com, digamos, mais liberdade do que aqui. E eu quase não escrevo nele, mas ontem meu laptop deu uma daquelas "morridas" e, depois de umas duas horas tentando reavivá-lo em vão, desisti e fui para meu quarto. Um fluxo de pensamentos no meu journal e vejo tudo com mais clareza.
Quando eu tinha uns doze anos, eu "amava" um menino da minha sala. Bom, ele não sabia, mas enfim. Durante as férias, que duravam mais ou menos três meses, eu simplesmente ficava sem saber o paradeiro dele. E tudo bem, eu ficava triste mas não desesperada e tratava de curtir as minhas próprias férias.
Agora pense na mesma situação nos dias de hoje. Pense comigo. Três meses? Férias? Ei, Orkut tá aí pra isso, assim como Facebook, Twitter, blogs... É quase impossível não saber o paradeiro de alguém. O ser "online" nunca está desatualizado, nunca está desaparecido.
Eu pensei em tudo isso porque quase tive uma síncope quando meu laptop me impediu de estar na internet. Por mais que não tivesse nada de novo lá, eu precisava ficar online, porque sabe, quem sabe não acontece alguma coisa?
Antigamente, acredito que as pessoas tinham um ritmo de vida mais sólido. Digo sólido como algo que está determinado, onde pensamentos e ações têm lugar definido e espaço suficiente para acontecerem. Hoje, parece que vivemos com dez janelas do firefox abertas o tempo todo. Somos multitarefas e "nulitarefa" porque fazemos muito e não fazemos nada. Com tanta informação pulando em nossos olhos, não nos concentramos em nenhuma.
Agora, voltando às relações humanas. Vamos pensar num casal de namorados. Em 1750, um casal de namorados, quando não estavam juntos, podiam se comunicar através de cartas. Uma carta leva tempo para ser escrita e mais um tempo para ser enviada, recebida e respondida. Todo mundo sabia disso. Então, uma namorada não iria ficar grudada o dia todo na caixa de correio esperando pela carta de seu amado. Ela sabia que cedo ou tarde a carta iria chegar e ela seria avisada de alguma forma.
Em 1970, um casal de namorados podia além da carta, usar o telefone para se comunicar. O telefone fixo precisa de alguns pré-requisitos para conectar duas pessoas. Ele não está em todos os lugares, portanto era preciso ou estar em casa ou em algum local fechado (tirando os orelhões). As duas pessoas envolvidas, por sua vez, precisam estar em locais próprios para conversarem. Todo mundo sabia disso. E, sendo assim, um casal levava uma vida normal até o horário estipulado por ambos para se falarem ao telefone. Não adiantava ligar fora de hora, é possível que a outra pessoa não estivesse, o que era completamente compreensível.
Já em 2009, não há desculpas para se esconder. Um casal de namorados fica se ligando via celular a toda hora. "Onde você está?" "Quem está com você?" "Por que você deixou o celular desligado?". MSN, Gtalk e Skype servem para monitorar a vida online. E Orkut, Flickr, Facebook, Myspace, Twitter, Blip e afins são como indicadores de com quem você anda, "quem é aquela vadia que tá falando com ele" e qual o pé do relacionamento, através do famigerado estado civil. Muitos casais se formam através da internet, mas acredito que mais deles ainda se desmancham graças à desconfiança e bisbilhotagem dos meios eletrônicos do parceiro. Estes são, por fim, uma nova, aprimorada e potencializada mancha de batom no colarinho.
A internet criou uma necessidade. Antes, nós não tínhamos nem ideia do que era ficar na frente de uma caixa com tela brilhante que nos diz tudo sobre tudo e que nos dá praticamente o poder da telepatia, da premonição e da clarividência. Hoje, tente tirar esta caixa da frente de alguém. Gritamos como macacos, ou como bebês privados de suas mamadeiras. Quando nos desconectamos da rede, não nos desconectamos totalmente. É como se todas as linhas invisíveis das operadoras de celulares, das conexões wifi e dos satélites passassem por dentro de nossas cabeças, deixando-nos sempre alertas.
Em um tempo que Google é Deus, somos filhos dos bytes e das conexões wireless.
E não somos melhores.

13.7.09

piration time.

uma das indagações mais antigas do homem: carpe diem ou all work and no play?

enquanto eu tentava cortar um pedaço de frango congelado, obviamente com a faca errada e da maneira errada, um túnel espaço-temporal abriu-se na minha mente e eu comecei a pensar: estou congelando meus dedos neste frango só porque eu quero economizar cem reais no fim do mês com o almoço incrivelmente barato para os moldes paulistanos porque eu acho que fazendo isso eu conseguirei juntar mais dinheiro para viajar daqui dois anos. mas, por que estou fazendo isso se nem sei o que me acontecerá amanhã e me privo estupidamente dos prazeres da vida agora em vista de um futuro incerto?

sim, não há resposta. é tudo um jogo de apostas.
e, como em toda aposta, a sorte pode ser favorável. afinal, qual é a diferença entre um ex-gari que virou milionário porque investiu no ramo das batatas roxas no final do séc 19 e um gari que morreu sendo gari? inteligência, jogo de cintura, sorte?

olhe a sua volta. quantos caminhos a serem percorridos! quantos entroncamentos, desvios, buracos e retornos. acredito que nós nunca saberemos se o caminho que resolvemos tomar foi o melhor, o mais apropriado, o menos arriscado.
se eu pudesse dizer alguma frase de efeito para acabar este texto e que fizesse sentido, eu diria que o importante é perceber que todo volante é feito para girar as rodas, e que quase toda estrada é contornável.

hum, valeu?

addendum (14.07.09): acabei de ler isso em American Gods, do Neil Gaiman, e acho que tem a ver.

"'What path should I take?' he asked. 'Which one is safe?'
'Take one, and you cannot take the other,' she said. 'But neither path is safe. Which way would you walk - the way of hard truths or the way of fine lies?'"

6.7.09

back.

Na minha família, todos os primos eram mais velhos. Quando eu tinha 6, eles tinham 15. Daí quando todos se reuniam para conversar sobre o novo disco do Biquini Cavadão ou das novas camisetas da Hering que brilhavam no escuro, eu ficava meio de canto, tentando entender alguma coisa.
Mas eu tinha um primo da minha idade, o Leandro. No Natal, era pura diversão. Um parente sempre se vestia de Papai Noel e, meia noite, ele descia as escadas da casa da minha avó paterna tocando um sininho. Depois, sentava na sala e tirava vários presentes do saco, a maioria endereçados aos caçulas, o Leandro e eu.
A gente acreditava e tudo. Até que um dia, eu vi meu tio subindo as escadas para se trocar e corri pro Leandro: "O Papai Noel é o tio Ciro!". Mesmo assim, curtíamos a brincadeira, até porque era óbvio que o verdadeiro Papai Noel existia. Tanto que outro passatempo era ficar no jardim olhando pro céu e buscando o trenó dele.

Ontem eu encontrei o Leandro na festa junina da família do meu pai. A gente pouco se vê, então foi como voltar uns 15 anos no tempo. Ele citou quando descobrimos a verdade por trás do Papai Noel, mas não lembrava de ficar procurando o trenó no céu. "Nossa, você ativou uma parte da minha memória que eu não usava há muito tempo!", disse. "É, estamos velhos" complementei.

Entre tantos problemas adultos, disputas, depressão, brigas e rancor que rodeiam minha visão de família e de terra natal, esta conversa com meu primo foi um momento mágico, em que eu não tinha mais 23 anos, mas 6, e eu acabara de descobrir que o Papai Noel que descia as escadas era meu tio e então corria para o jardim da casa da minha vó olhar o céu. De repente, tudo a minha volta era quente e colorido, a Xuxa cantava na tevê e meus primos conversavam sobre New Kids on the Block. Minha mãe abraçava meu pai e dava bronca nos meus irmãos por estarem comendo antes da hora. Minha avó passava por mim e sorria carinhosamente, perguntando se eu estava ansiosa. E eu rodava minha saia de lambada, animada pelas próximas horas.
Era Natal, e quem se preocupava com o futuro? Nós estávamos imersos para sempre naquela redoma de felicidade e ninguém ousaria pensar que algo um dia seria diferente.

3.7.09

sobre.

Meus textos são cuspidos.

São partes de um momento.

São fragmentos de um lampejo inspirador.

Não são definitivos.

Nem ao menos definidos.

São sentimentos condensados, transformados em palavras.

Não os leve muito a sério.

Não os esqueça assim tão fácil.

Pois eles são uma parte de mim.

E uma parte de você.

Eu não os escrevo para você.

Mas você os lê.

Obrigada.