22.4.09

Dalila #2

Com quatro reais em moedas menores na mão, Dalila sentia o estômago roncar. Cinco horas da tarde de um domingo sem graça. Entrou num boteco qualquer e passou com a mão esquerda estendida por meia dúzia de homens sujos e feios, que assistiam hipnoticamente a um jogo de futebol na tevê. Ignorada por todos, saiu praguejando baixinho qualquer coisa pela rua, até ser abordada por um taxista, que observava tudo de fora de seu carro estacionado.
"É final de campeonato, sabe? Eles não vão te ouvir."
"É."
"Mas o que você quer? Comida?"
"Hu-hum"
"Toma, não gosto de atum. Minha mulher insiste em fazer de atum, ela sabe que eu não gosto."
Dalila aceitou o sanduíche. O gosto era estranho, parecia estragado, mas ela não podia reclamar.
"Agora vem aqui garota, deixa eu ver essa sua tatuagem."
Ela fingiu não ouvir.
"Vem aqui, sua malagradecida."
Dalila levantou seus olhos para o taxista, que a encarava como um animal encara sua presa. A menina guardou lentamente o sanduíche dentro de uma pequena bolsa improvisada com panos e deu sinal ao primeiro ônibus que passou. Ao subir os degraus, ainda pôde ouvir os xingamentos feios e confusos do homem deixado para trás.
Já no ônibus, Dalila sentou-se nos degraus que acabara de subir, encolhida, braços envolvendo as pernas. E, apoiando o queixo nos joelhos, ela fixou seu olhar no horizonte, ora observando o lusco-fusco que deixava os carros borrados, ora encarando seu próprio rosto, magro e vazio.

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